Em 1964 a TV Tupi de São Paulo lançava a novela “Alma Cigana” (às 20:00, de 02 de Março a 08 de Maio, 50 capítulos), que tinha a atriz Ana Rosa como protagonista vivendo as gêmeas Estela e Esmeralda. A novela era situada na Espanha durante a Revolução Espanhola (1936-1939). No final do mesmo ano a TV Tupi em conjunto com a TV Rio lançaram “O Direito de Nascer”. A novela era situada em Cuba, no ano de 1899, e tinha Amilton Fernandes no papel principal, que era Albertinho Limonta. Assim Ana Rosa e Amilton Fernandes foram os primeiros a viverem estrangeiros em papel principal, em terras do exterior, nas chamadas “novelas de época”. Coube, então, ao ator Sérgio Cardoso viver o papel principal da primeira novela contemporânea que tinha um imigrante como protagonista.
“O Cara Suja” foi uma novela produzida pela TV Tupi de São Paulo com direção de Geraldo Vietri e texto de Walter George Durst adaptado da novela do autor mexicano Roberto Valente.
“O Cara Suja” era exibido de segunda a sexta, às 20 horas, de 01 de Abril a 13 de Julho, num total de 74 capítulos [um marco, considerando-se que, à época, as novelas do horário tinham 50 capítulos, em média]. Embora o texto original tratasse da história de um espanhol, Walter George Durst revolveu fazer a adaptação para um italiano (vindo de Catanzaro, na Calábria). O fato de Walter George Durst e a TV Tupi serem da capital paulista, onde é imensa a colônia italiana, obviamente ajudaram na decisão.
A história narrava as dificuldades de Ciccillo Nascareda (Sérgio Cardoso) em conquistar o amor de Yara (personagem da atriz e dubladora Rita Cléos), que pertencia a uma família tradicional paulistana em franca decadência por causa de dívidas.
Ciccillo – um calabrês do tipo bem tosco – chegara pobre ao Brasil e transformou-se num milionário do dia para noite por causa de um golpe de sorte jogando na loteria. Do interesse da família de Yara na fortuna de Ciccillo surgiu a proposta: fazer o calabrês casar-se com a moça a fim de se manter na lata sociedade. A história girava em torno do desprezo que Yara [a quem, para desespero da própria, Ciccillo chamava de Biondina] nutria pelo “carcamano”, que se apaixonara assim que a conhecera. Interessante é que Sérgio Cardoso e Rita Cléos já haviam trabalhado juntos no teatro quando ele já era conhecido e ela ainda era iuma atriz em início de carreira.
A trama simples e linear, que contava com um elenco enxuto de 12 a 14 artistas, não demorou a cair no gosto paulistano e atingir altos níveis de audiência, chegando a bater a famosa novela das 21 horas, O Direito de Nascer, também da TV Tupi.
Estavam no elenco: Percy Ayres, Juca de Oliveira [que anos depois, também na TV Tupi, faria Nino, personagem principal da novela “Nino, o italianinho”], Marisa Sanches, Norah Fontes, Gilberto Sálvio, Gian Carlo e Débora Duarte, entre outros.
Com a previsão inicial de 50 capítulos, “O Cara Suja” ganhou uma sobrevida devido à audiência, principalmente quando a trama trouxe uma rival para a Biondina: Marília, interpretada pela atriz Carmem Jóia. O triângulo formado pelos personagens, Biondina, Ciccillo e Marília tornou-se assunto obrigatório.
Afinal, com quem Ciccillo ficaria? Com Marília?
OU com a Biondina?
O sucesso de “O Cara Suja” não ficaria restrito a São Paulo. Embora ainda não houvesse o conceito de transmissão em rede, outras emissoras pertencentes aos Diários Associados também passaram a transmitir a novela, e com o mesmo sucesso. Foi assim na TV Tupi – Rio, canal 6. Na TV Alterosa (Belo Horizonte), canal 2.E na TV Piratini (Porto Alegre), canal 5. Na TV Piratini o sucesso da novela foi praticamente tão grande quanto o de São Paulo.
Houve grande repercussão a respeito do affair entre o ator Sérgio Cardoso e a atriz Carmem Jóia.
Coisa que não ficou fora do bom humor brasileiro.
A aproximação do final da novela chegou a causar celeuma por causa da notícia de que Ciccillo morreria no último capítulo. Isso fez com que até a coluna O Cabresto, do sisudo jornal Folha de São Paulo, publicasse ironia a respeito em sua edição de 01 de Julho de 1965.
Como toda novela, “O Cara Suja’ possuía seu tema de abertura”. Tratava-se de “Se piangi, se ridi”, música cantada por Bobby Solo. Entretanto, o sucesso da novela foi tal que Sérgio Cardoso resolveu gravar a canção. A intenção do ator chegou a causar uma briga entre gravadoras.
Por fim, Sérgio Cardoso lançou um compacto simples pela gravadora Continental. De um lado “Se piangi, se ridi”, com direito a uma declamação para a amada Biondina, coisa que não havia na gravação original. Do outro lado, Sérgio gravou a canção “Biondina”, composição de Uccio Gaeta, músico e ator italiano radicado há muito no Brasil, que foi responsável pelo acompanhamento nas duas gravações. Num dado trecho da música ouve-se o termo “ma, chi lo sa” (mas, quem sabe) que foi uma espécie de bordão popularizado pelo personagem em inúmeras situações. O apelo do personagem foi tão forte que no selo do disco vinha a informação de que o intérprete era Sérgio Cardoso, o Ciccillo, colocado entre parêntesis. Infelizmente não há registros de nenhuma cena da novela. Mas você pode poder clicar nos players e ouvir as gravações das canções do compacto simples na voz de Sérgio Cardoso.